Ah...viajar...ouvir essa palavra me trás tanta
inquietude e uma vontade imensa de correr para pegar minha velha mala,
que está antiquada e acabada, mas que nunca me desapontou...
Não sei o que ocorre com os viajantes, mas estou a
ponto de acreditar “seriamente” na existência de uma espécie de contaminação,
que surge com a primeira viagem e vai se desenvolvendo cada vez mais à medida
que ocorre o contato com o novo destino.
Conhecer um lugar diferente, apreciar belezas
incomuns, ter contato com outras culturas e estilos de vida, tudo isso nos tira
instantaneamente daquela zona de conforto caseira e nos joga na cara que não
precisamos de nada do que temos para viver.
Imediatamente, passamos pela maior sensação de
liberdade até então já vivida, nos esquecemos do trabalho, desapegamos do
relógio, relaxamos com os compromissos sociais. A virulência é tão grande, que logo
no primeiro dia fora da rotina já somos arrebatados por uma enorme onda de desprendimento,
que nos faz simplesmente apertar um reset para todas as nossas manias, nossos
apegos e nossas preocupações.
O sintoma mais aparente é a descoberta (e as várias
redescobertas, a cada dia que precisamos usar nosso passaporte) de que o estilo
de vida idealizado é exagerado demais, ou que os sonhos de uma vida consistente
e material não são sinceros.
Em outra cidade, outro estado e, mais ainda, em outro
país, não temos conhecidos, não precisamos seguir padrões, somos simplesmente
mais um nas ruas. Repentinamente, não sermos notados nos faz tão bem que passamos
a desejar não sermos notados aonde vivemos.
Quando estamos viajando, não precisamos estar tão
atentos às redes sociais e ao e-mail, ninguém nos cobra compromissos,
simplesmente porque não conhecemos ninguém, e esse anonimato nos devolve o
desejo de sermos outra pessoa.
Em terras distintas conhecemos pessoas com histórias de vida muito diferentes das nossas e daqueles com quem convivemos (que sempre seguem uma trajetória bastante linear, sem grandes surpresas).
Percebemos que, se podemos viver bem e realizados com
apenas aquela malinha de roupa escolhida, significa que não precisamos do resto
que ficou no armário. Dispensamos padrões de moda, ousamos desfilar outro
estilo, afinal, não haverá reprovação visual. Não precisamos daquele tanto de
cosméticos que temos no banheiro, nem daquele tanto de bolsas a escolher em
cada dia. Nos basta um sapato bem confortável, uma bota, um tênis... ou
havaianas de preferência, itens esses que saem do nosso armário raramente
quando estamos em casa.
Cabelo? Deixamos de implicar com o nosso, afinal, o
secador do hotel nunca funciona muito bem mesmo. Incorporamos a rebelde com
orgulho. Conversar com estranhos, sem problemas! Passamos a fazer isso com
frequência. Quanto mais moderno e agitado o local escolhido, mais nos sentimos
a vontade para desfilar nas ruas, para conversar sobre qualquer assunto, em
qualquer tom de voz, sem aquela mania de perseguição de olhar para trás
morrendo de medo de ter um conhecido ouvindo.
Dançamos com liberdade, somos mais simpáticos.
Passamos a dar valor às culturas diferentes e seus padrões de vida. Culturas
mais simples nos dão um “tapa na cara” para divorciarmos dos nossos
preconceitos e darmos mais valor à natureza.
E quando retornamos à realidade, percebemos que
nossos sintomas não se tratavam de um vírus, mas de uma doença autoimune, que
vive em nosso organismo, corre em nossas veias, adormece e desperta cada vez
que descemos de um avião.
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